Transcrevemos aqui, por sugestão de Paulo Borges, as palavras de apresentação do nº 3 da revista "Cultura Entre Culturas", proferidas ontem na Casa Fernando Pessoa por Luiz Pires dos Reys, director de arte da publicação.
Integraram a mesa Paulo Borges (director), António Baptista Lopes (Âncora Editora), Miguel Real (romancista e ensaista) e Luiz Pires dos Reys (director de arte).
A leitura do texto integral pode ser feita mediante download a partir do link no final deste post.
Acredite-se ou não, entro hoje pela primeira vez nesta Casa.
Mas, será a, por assim dizer, primeira vez a primeira vez de qualquer coisa? Ou será a decisão de entrar, um dia, nesta ou noutra casa o que é verdadeiramente primeiro?
Chamando a mim adequadas palavras de Casimiro de Brito, a abrir o seu Labyrinthus – entro aqui “devagar e subterrado”.
Devagar, porque este lugar é para ser visitado com vagar. Subterrado, porque é o seu quê esmagador o que aqui se respira. Não que seja sufocante, mas porque, pelo contrário, tem algo da vastidão de um deserto: árido e sufocante apenas para quem não saiba, como eu porventura talvez não saiba como atravessá-lo incólume.
Entrar é propriamente consentir - sentir com, portanto. Consentir, ou consentir-se, é aceder ao entre (esse âmbito desprovido de verdadeiro espaço mas, ainda assim, não menos real) ao entre que vai da soleira da porta até ao ponto mais recôndito, difuso e quase esquecido que há dentro, passando pelo d’entre que, deste modo, se insinua manifesto entre mim e esse, digamos, antro que vai entrando por mim adentro.
É portanto, como se vê, pura inter-penetração o movimento de entrar, onde quer que o esbocemos. Aliás, apetecia-me dizer inter-penentração, não fora isso mais perplexivo do que propriamente aclarador.
O que isso quereria dizer é que eu (ou outro alguém) que entro na casa, nesta casa, sou, mediante tal acto, posto no âmbito entre que, misteriosamente, medeia o aquém da porta e o além dela. Isso, que displicentemente supomos saber, não sabemos realmente o que seja.
É porventura apenas o não ser uma coisa nem outra, nem fora nem dentro, nem porventura sequer o transcurso de um para o outro.
A casa, acolhe-me assim como o que é abertura de receptividade, pública, digamos – abrindo-se-me, no abrir-me o seu espaço interno. Mas, este espaço interior é mais propriamente impasse, para quem entre, e (perdoe-se-me a bizarria da expressão) impasse entre-ior.
O dentro da casa é sempre o fora de mim, e abre-se-me em intimidade na medida apenas em que eu sinta que ela, a casa - qualquer casa ou espaço, âmbito ou contexto que seja - me convida a entrar nele, e me acolhe assim.
O seio da casa, contanto que eu o não sinta intimidante, e o adopte por assim dizer como intrínseco ao meu diálogo com o seu espaço visitável ou habitável, passará a ser parte de mim e, deste modo - ainda que já interior também a mim, em certa medida - mantém-se relativo a um campo sempre re-visitável, que nesse sentido me permanecerá sempre exterior.
O que medeia entre uma coisa e a outra, isto é, entre a intimidação de alguma eventual estranheza e a intimidade por assim dizer con-cêntrica comigo - isso é, propriamente, aquele campo, aquele âmbito, que aqui designamos por Entre.
http://pt.scribd.com/doc/65755937/Apresentacao-da-revista-Cultura-Entre-Culturas-nº3-por-Luiz-Pires-dos-Reys-na-Casa-Fernando-Pessoa-20-de-Setembro-de-2011
http://pt.scribd.com/doc/65755937/Apresentacao-da-revista-Cultura-Entre-Culturas-nº3-por-Luiz-Pires-dos-Reys-na-Casa-Fernando-Pessoa-20-de-Setembro-de-2011
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