Alguns aspectos da ética podem justamente ser considerados universais, ou praticamente universais. A reciprocidade, pelo menos, parece ser comum a todos os sistemas éticos. A noção de reciprocidade pode ter servido de base à «regra de ouro» - trata os outros como gostarias que te tratassem -, que eleva a ideia de reciprocidade a um princípio distinto não necessariamente relacionado com o modo como alguém nos tratou no passado. A regra de ouro encontra-se - com diferentes formulações - numa grande variedade de culturas e ensinamentos religiosos, incluindo, numa ordem aproximadamente cronológica, os de Zoroastro, Confúcio, Mahavira, no «Levítico», em Hillel, Jesus, Maomé, Kant e muitos outros. Na última década assistiu-se a uma tentativa de redacção de uma «Declaração de Uma Ética Mundial», uma afirmação de principios que são universalmente aceites em todas as culturas. Este projecto teve início num encontro conhecido como «Parlamento das Religiões do Mundo» - mais estritamente falando, o Segundo Parlamento das Religiões do Mundo, pois este reuniu-se em Chicago em 1993, um século depois da sua primeira reunião. Circulam actualmente diferentes versões da declaração. Uma delas, redigida pelo teólogo Hans Kung e aprovada pelo Segundo Parlamento das Religiões do Mundo, principia com uma exigência fundamental de que «todo o ser humano seja tratado humanamente». Tornando esta exigência mais precisa, refere-se a regra de ouro como «norma irrevogável e incondicional aplicável a todas as áreas da vida». Leonard Swidler, que preside ao Centro para a Ética Mundial, na Universidade de Temple, em Filadélfia, publicou uma versão revista deste documento que considera a própria regra de ouro a regra fundamental da ética.
Peter Singer, Um Só Mundo, 2004, Gradiva, Lisboa, pp.196-197
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