sábado, 24 de outubro de 2009

"Este quase-nada efervescente"

Observa então os objectos que advêm no exterior.
Mais enganadores que falsas aparências,
São, como a água de uma miragem,
Evidentemente um sonho, uma alucinação mágica,
Semelhante ao reflexo da lua na água, semelhante ao arco-íris.

No interior, observa a tua mente:
Mesmo que capte a atenção quando não cuidamos,
Examinando-a, a sua “própria natureza” não se pode encontrar;
Um nada que se faz passar por alguma coisa, vazio e transparente;
Não se o pode definir dizendo: “é isso !”,
Este quase-nada efervescente.

Contempla o que se mostra
Em cada um dos dez orientes:
Qualquer que seja o aspecto,
A Realidade, sua essência,
É a vacuidade, espírito do abismo.

Sendo todas as coisas da natureza do vazio,
Visto ser o vazio que observa o vazio,
Quem esvaziará o que há a esvaziar ?

A ilusão mágica é testemunha da ilusão mágica,
E o extravio observa o extravio:
A partir daí que fazer das numerosas categorias
Tais “vazio” e “não-vazio” ?

[...]

“Dualidade”, “não dualidade” e assim por diante,
Todos estes quadros, ficções extremistas,
Deixa-os, como os remoinhos de um rio,
Apagarem-se naturalmente em si mesmos.

- Nyoshül Khen Rinpoche [Tibete, 1932-1999), "O espelho das chaves” [excertos], Le Chant de l'Illusion et autres poèmes, traduzido do tibetano, apresentado e anotado por Stéphane Arguillère, Paris, Gallimard, 2000, pp.87-88.

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