Rafal Olbinski
Desloca-se sobre o verde da terra. Gira, lenta e vagarosa sobre si mesma, a geodésica de sal e ar. As nuvens coladas ao algodão da paisagem sobem em espiral para fora de dentro do espaço com torres e arcos arredondados. As torres são a geometria de uma levitação. A fundura espiralada de uma maçã de Magritte, lembrada na proporção clara de um azul-mais-que-perfeito. A profundidade sobe ao cimo. A vertical surrealidade da árvore é um píncaro, uma agulha que sombreia a horizontal e deitada mancha no solo. Florirá o caduceu, a vara de Moisés, até a flor de Alexandria sobre os montes onde dorme a geografia do corpo dos homens. A montanha por onde o sol penetra até à lisura de uma polida pedra. A fragilidade do cristal e a gota do orvalho que reflecte a lua e as águas pantanosas da chuva.
Olharás o Norte com os pés serpentinados no horizonte de pedra que sombreia a montanha azul; olharás por dentro do olho em fogo do Egipto a oblíqua deliquescência das rosas e da flor da claridade. A montanha azul é atravessada por gritos. Atravessa-se o grito por um buraco na curvatura da terra. Caímos de nós próprios. As raízes são pés de tamarineira e flor de olhos. As estátuas engolem o abismo, já os limoeiros e a hortelã refrescam os botões das rosas germinadas do sol, entre círcudos concêntricos e excêntricos. Atravessa-se a montanha para se chegar ao lugar do regresso. Estará fixo ao colar da deusa um diadema de lata. O mercuriano metal dos espelhos e dos lagos. Partirás do lugar de todos os lugares equidistante do mundo; de dentro e de fora dele; e nascerás aos olhos de deus como uma luz que gira; um olho cego do sol, lugar onde a raiz é folha e o espelho do olhar se demora ternamente na semente que vai entrando na terra como dela saem as asas entre duas montanhas a eterna espiral cai na inércia dos dias pisados. Como se houvesse tempo e tudo não tivesse acabado tão jovem em tudo o que germina. Gira sobre a roda dos dias a ausência do Real finistindo-se em canto.
1 comentário:
Entre as estátuas (que “engolem o abismo”) e as torres (“geometria de uma levitação”) vamos pela “fragilidade do cristal e a gota do orvalho”: como se “tudo não tivesse acabado”, “como uma luz que gira” para “se chegar ao lugar do regresso”.
Evaporam-se-nos os pólens dos dedos trans-lúcidos como anunciadas crisálidas.
O chão das cores que nos desarmam em seu escutar-nos repõem percutida a brevidade dos mais finos deslumbres.
Na dança que nos embala a roda festiva, hesitamos ainda entre ser rio e sermos o riso infante que nos é pálpebra daquela arte da fuga que se executa em nós com pétalas no lugar de dedos.
Somos sem mãos, os que somos. Perfumes apenas.
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