domingo, 26 de setembro de 2010

"Já estamos no Reino: a eternidade é agora."

André Comte-Sponville

Comte-Sponville faz o elenco das razões que o levam a não crer em Deus, sendo uma das principais a existência do mal: como é que Deus é compatível com tanta maldade e sofrimento no mundo? Mas afirma-se espiritual - prefere a expressão espiritualidade a religiosidade, porque a religião está vinculada em princípio a religiões institucionalizadas -, no quadro de um certo tipo de experiência mística, feito de evidência, de plenitude, silêncio, experiência oceânica, simplicidade, eternidade... Quando falta Deus, há "a plenitude do que é, que não é um Deus, nem um sujeito". Há o Todo, pouco importando os nomes: o ilimitado (Anaximandro), o devir (Heraclito), o ser (Parménides), o Tao (Lao-tsé), a natureza (Lucrécio, Espinosa), o mundo ("o conjunto de tudo o que acontece": Wittgenstein), o real "sem sujeito nem fim" (Althusser), o presente ou o silêncio (Krishnamurti) - "o absoluto em acto e sem pessoa".

Quando não há Deus que nos salva, que é a espiritualidade? "É a nossa relação finita com o infinito ou a imensidade, a nossa experiência temporal da eternidade, o nosso acesso relativo ao absoluto". O que faz viver não é a esperança, mas o amor; o que liberta não é a fé, mas a verdade. "Já estamos no Reino: a eternidade é agora".

Anselmo Borges, Religião e Diálogo Inter-religioso, 2010, Imprensa da Universidade de Coimbra, pp.54-55

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