quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Pura Alegria

As Três Graças - Pintura de Oleg Zhivetin
É vivendo que eu encontro o êxtase - a simples sensação de viver é pura alegria.
Emily Dickinson

A pura alegria é este céu que, doido, estendido em azul infinito, tocado pelas árvores altas, debaixo das quais a terra está a florir constantemente. Pura Alegria é a catedral dos olhos na Sé santa do subido olhar sobre a espessura criadora da Terra. Terra debaixo e no interior da qual, na irrupção do momento eterno, a pedra e o ouro nos falam em sílabas e sopros de sons e de música. Pura alegria é a alma de todas as coisas, é todas as coisas terem alma no corpo. Em nós, humanos, a pura Alegria é a participação em toda esta dança: a dança dos elementos na dança do nosso ritmo singular. Eu sou. Não para mim, não em mim, não para o outro, mas no outro. Eu sou tu. Esta é a alegria. Que velada, ou real, parece ausente na instante Presença, e é presença pura na Ausência; sombra ou luz, afinada corda, ou dissonante nota. Isso é pura alegria de achar, não de procurar. Pura alegria é um jardim ser, todo ele uma fala limpa, uma cegueira extrema.
Cantar uma canção é reconhecer o rosto desfeito da claridade, ou o escuro medo de um verbo: lâmina afiada na face fina da lua. No seu contorno nítido e brilhante. Espectro de mim, é esse avesso e direito do coração colado ao céu-da-boca. E isto é Saudade e Amor. Saudade da silente presença do que existe no deserto do coração. Amor por ser na vibração de cada átomo, em cada fibra do ser, o “milagre” da existência do mundo e a Saudade de o não haver; a quietude que não é a da montanha na paisagem, senão a interior paisagem na montanha da alma. Alma que não é a do jardim deserto, que não é só a do homem na gruta do seu coração; nem é apenas a divina centelha fora de nós, de dentro. Pura alegria é ser ébrio de tudo, na Natureza de nós. Saudade de entre a Natureza e o Homem não haver cisão, mas ligação profunda, às vezes velada, e em seus véus descoberta e despertada; pura alegria é achá-la sem a procurar, por encontrar no milagre do canto a voz de deus saudosa a murmurar. Pura alegria é aquilo que é, para lá do visível. Isso é a pura alegria! Prisma de todas as cores, no movimento que em branco néctar as mistura a todas e as faz desaparecer no olho vesica de um infinito olhar.

2 comentários:

Paulo Feitais disse...

Aquilo a que eu, na minha adolescência, chamei «Alegria Mater» e que descobri aquando da morte precoce duma amiga muito próxima.
A profunda comunhão coalescente que tudo une em díspar unidade.
A Alegria, a Dor e a Graça, interceptam-se em volutas de pura excessividade.
:)

Anónimo disse...

Estas que são as filhas da "Alegria Mater" e são-no no que não tem Nome, mas em seu mistério natural fecundo se renasce em caminhos de onde se não pode regressar. Mal se pise o "jardim": "a claridade", "a que faz brotar as flores" e a "Alegria", chegam a cantar a álacre infância de tudo o que nasce "Jardim", ainda que humilde pé de flor.

Um abraço e :)