sábado, 7 de janeiro de 2012
Um outro Natal: O Carnatal (excerto da crónica publicada na revista CAIS de Janeiro)
O autêntico Natal pagão e cristão implica sempre um (re)nascimento, uma mutação da consciência e por vezes a vivência de um mundo ao arrepio das normas, onde a experiência do sagrado consiste em transcender aquilo que se venera como mais sagrado (o “sagrado de transgressão”, segundo Roger Caillois). Na Idade Média o Natal ainda coexistia com as Festas dos Loucos, de meados de Dezembro até à Epifania, em 6 de Janeiro, com comida, bebida e danças nas igrejas e nos altares, missas burlescas com burros a zurrar, homens vestidos de mulheres e vice-versa, crianças tornadas Imperadores a quem a hierarquia eclesiástica tinha de obedecer, etc. Proibidas nas igrejas, originaram o Carnaval moderno, tendo sido a forma medieval cristã do mundo às avessas presente noutras culturas como ritual do regresso cíclico do cosmos ao Caos primordial onde a liberdade, a metamorfose, o jogo e a festa predominam sobre a delimitação do sagrado e do profano, do divino, do animal e do humano e dos papéis psicológicos e sociais, com a vida orientada para o trabalho e a produção.
Correspondendo ao solstício de Inverno, as Festas dos Loucos continuam antigos festejos pagãos, como as Saturnais, onde se celebrava o regresso à abundância da Idade do Ouro com a troca de presentes e o travestimento dos dois sexos. Estas festas ainda estão bem vivas no Nordeste transmontano, crendo-se que delas depende a renovação da energia vital, a fertilidade das mulheres, dos animais e dos campos. Como ainda hoje se diz, por ocasião das tropelias e mascaradas praticadas nas Festas dos Rapazes e outras: “É Natal, ninguém leva a mal!”. Um Carnatal, como pude presenciar…
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